Memórias de uma Gueixa

Autor: Arthur Golden
Título original: Memoirs of a Geisha
Tradução: Lya Luft
Editora: Arqueiro
Páginas: 448
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| Livro cedido em parceria com o Grupo Editorial Arqueiro |

Sinopse: Olhos cinza-azulados. Muita água em sua personalidade, é o que diz a tradição japonesa. A água que sempre encontra fendas onde se infiltrar, cujo destino não pode ser detido.  Assim é Sayuri, uma das gueixas mais famosas de Gion, o principal distrito dessa arte milenar em Kioto. Com um olhar, ela é capaz de seduzir. Com uma dança, ela deixa os homens a seus pés.  O que ninguém sabe é que, por trás da gueixa de sucesso, há um passado de perdas e desilusões de uma mulher que, desde o dia em que o pai a vendeu como escrava, fez cada uma de suas escolhas motivada pelo amor ao único homem que lhe estendeu a mão.  Neste livro acompanhamos sua transformação enquanto ela deixa para trás a infância no vilarejo pobre e aprende a rigorosa arte de ser uma gueixa- dança e música, quimonos e maquiagens; como servir o chá de modo a revelar apenas um vislumbre da parte interna do pulso; como sobreviver num mundo onde o que conta são as aparências, onde a virgindade de uma menina é leiloada, onde o amor é considerado uma ilusão.  Já idosa, vivendo nos Estados Unidos, ela narra suas memórias com a sabedoria de quem teve uma vida longa e o lirismo de quem soube encontrar nela seu lado mais doce.  Neste relato único, que reúne romance, erotismo e, muitas vezes, a dura realidade, Arthur Golden desenvolve uma escrita refinada e dá voz a uma personagem instigante e humana que conquistou milhões de leitores em todo o mundo.

Dos livros que eu já ouvira falar e que já haviam despertado interesse em mim, mas nunca tinha me aventurado a ler, Memórias de uma gueixa certamente foi o que me proporcionou a melhor experiência até agora, e poucas palavras tenho para descrever a sensação que a leitura me causou — o que não quer dizer que eu não vá tentar.

Chiyo nasceu em Yoroido, uma pequena e pobre vila de pescadores no Japão. Filha de um pescador idoso e uma mãe doente e irmã de uma adolescente comum, levava sua infância como qualquer outra criança camponesa levaria, com o diferencial de sua beleza inusitada e seus intrigantes olhos acinzentados. Tudo mudo quando um homem, Sr. Tanaka, convence seu pai a levar as meninas para longe de casa, separando-as na grande Kioto. Sem saber para onde irá sua irmã ou se poderá retornar, a menina de 9 anos desce do trem e é entregue a uma das mais bem sucedidas okiyas da cidade, uma casa para gueixas, na qual enfrentará as maiores dificuldades possíveis com a esperança de, algum dia, tornar-se uma gueixa.

Quando espiei pela janela, vi o Sr. Tanaka caminhando de volta à sua carroça [...].
Um instante depois minha irmã disse:
— Chiyo-chan!
Enterrei o rosto nas mãos. E, honestamente, se pudesse teria me jogado no assoalho do trem e rolado de angústia. Porque, do modo que minha irmã pronunciara meu nome, não era preciso dizer mais nada.
P. 39-40


Fica claro, pelo título, que se trata de um livro de memórias. Quem conta a história é a própria Chiyo, no tempo em que narra Sayuri, uma das maiores gueixas de Kioto, mas agora já idosa. O livro contém as minuciosas lembranças de Chiyo de sua infância, desde sua vida na vila, antes de conhecer o Sr. Tanaka, até os complexos rituais de preparação das gueixas. Em alguns momentos, a narradora dá alguma pista sobre o futuro, mas o que segue é uma narrativa linear bem explicada e sentimental, com as nuances da mentalidade adulta de Sayuri.

Desde o primeiro capítulo, fui completamente fisgada pelo que lia. Não houve uma só linha que me deu vontade de pular, ou tédio, ou em que a narrativa deixou de ser interessante. O autor cria uma ficção tão realista no que tange à personalidade complexa da narradora que é difícil de assimilar que não tenha existido uma Sayuri de verdade. Esse efeito, é claro, se dá devido aos estudos de Golden acerca da cultura japonesa, pela qual passou tantos anos adquirindo conhecimento e fascínio.

Como mencionei, o livro é repleto de minúcias, seja nos sentimentos que Chiyo coloca em suas lembranças mais distantes, seja nas descrições tão fieis e realistas dos quimonos que a menina vê ou usa, dos penteados das gueixas e aprendizes ou das faces das personagens que encontra. Cada detalhe cria uma narrativa muito rica. Não são meras descrições físicas ocupando várias linhas e parágrafos a fio sem que haja algo de interessante: são vislumbres das sensações experimentadas por Chiyo.

Além disso, a empatia que o leitor tem pela personagem é inevitável; o tempo todo, fica uma sensação de preocupação e ansiedade para saber o que será da vida da pequena Chiyo, como a jovem Sayuri irá chegar a ser quem quer ser e o que levou a gueixa já adulta a ser a idosa que é agora. É como se você começasse a desenhar um círculo, sendo o ponto de partida a vida atual de Chiyo e todo o perímetro da circunferência fosse sua vida desde a infância até retornar à vida adulta de onde a história é narrada. 

Achei Sayuri um lindo nome, mas era estranho não ser mais Chiyo. [...] A dona da casa de chá me fez uma pergunta e, quando me chamou de “Sayuri”, entendi o que me incomodava. Era como se a menininha chamada Chiyo, que corria descalça do lago até sua casa [...], jã não existisse. Senti que essa nova moça, Sayuri, com seu rosto branco e lábios vermelhos, a destruíra.
P. 179

Essa volta dá ao leitor a oportunidade de ver a evolução de uma criança ingênua para uma garota esperta lutando para sobreviver, uma jovem moça que se esforça para alcançar seu objetivo. Tudo isso sempre com a voz de Sayuri idosa, ela mesma julgando as ações de quando era nova com os olhos de sua eu atual.

Foi nesse momento que comecei a me dar conta de quanto fora ignorante [...]. Eu nunca entendera como as coisas estão estreitamente ligadas. Não falo apenas do zodíaco. Nós, humanos, somos parte de algo muito maior. Quando caminhamos, podemos esmagar um besouro, ou simplesmente causar alguma agitação no ar, de modo que uma mosca pouse onde não pararia. E se pensarmos no mesmo exemplo, mas conosco em lugar do inseto e com o Universo no papel que tínhamos desempenhado, fica muito claro que todos os dias somos afetados por forças que não controlamos [...]. O que devemos fazer? Temos de usar todos os métodos possíveis para entender o movimento do Universo ao nosso redor e marcarmos nossas ações de modo a não lutarmos contra as correntes, mas nos movermos com elas.
P. 137
Muito pesa o entendimento de que toda a idealização que Chiyo tinha a respeito da vida de uma gueixa vai sendo quebrada aos poucos; o conceito da dualidade grotesca é mais do que aplicável durante toda a leitura, sendo até dolorosa por vezes:

Eu não era digna daquele ambiente. Então me dei conta de toda a magnífica seda que envolvia meu corpo, e tive a sensação de me afogar em beleza. Naquele momento, a beleza era um golpe de dor e tristeza.
P. 200

Algo que me parece muito interessante também foi a maneira como o autor permitiu que sua personagem tivesse desenvolvido uma personalidade tão forte que é como se ele mesmo se vestisse de Chiyo e deixasse que ela falasse por si; ela possui uma personalidade tão palpável, tão completa, que é como se Golden não mais tivesse poder sobre ela e a narrativa ficcional fosse uma história real. 

De certa forma, o livro não deixa de ser real. Várias garotas japonesas tiveram suas infâncias interrompidas para se tornarem grandes gueixas, estudando as várias artes em que deveriam ser versadas e seguindo esse caminho até o fim de suas vidas. Várias eram filhas de outras gueixas, mas várias tinham vindo da pobreza total e procuravam uma forma de sobreviver. Tão real é o livro justamente por se basear nos relatos de uma ex-gueixa sobre tudo o que viveu, desde cada abuso sofrido dentro das okiyas até cada etapa do treinamento para se tornar uma gueixa. 

Pessoalmente, a leitura me foi encantadora. Parecia que o tempo parava a cada vez que me sentava para ler, e em um minuto que se tornava uma hora, 100 páginas já haviam ido embora. 

Como uma bola jogada no ar parece ficar suspensa imóvel antes de cair, eu me sentia suspensa numa calmaria onde o tempo não existia.
P. 219

Cheguei ao ponto de não me importar apenas com o desfecho de tudo, com os acontecimentos que ainda precisavam ser narrados por Chiyo e as lacunas que faltavam por preencher. Eu lia pelo simples prazer da leitura, algo que eu há muito tinha esquecido, mas que me foi resgatado por uma ficção tão envolvente e cheia. Muito bem dosado e explorado, Memórias de uma gueixa não me mostrou defeitos, apenas a qualidade que um romance histórico sempre deve ter e a graça e peso que um romance de memórias deve passar. 






13 comentários :

  1. Oi Bel, eu tenho que dizer que conheço muito pouco (pra não dizer nada) da cultura que envolve as Gueixas e até hoje nunca tinha tido nem curiosidade, mas sua resenha tá bem empolgada e acabei sendo contagiada e vou pesquisar mais sobre elas. Quanto ao livro, se tiver oportunidade vou querer ler sim e acho que a história da nossa protagonista que inicia sua preparação pra Gueixa bem cedo, aos 9 anos, deve ser bem interessante ;)

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  2. Oii Bel! Adorei a resenha, nucna tinha ouvido fla da obra, eu fiquei bastante interessada na escrita tbm, qro conferir!
    Bjs!

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  3. Uau, fiquei apaixonada por essa resenha. Eu amo a cultura de gueixas, acho uma coisa tao sensível e tao bonita e triste ao mesmo tempo, não sei bem explicar, já li muitas matérias, noticias e relatos e amo. O livro eu já tenho ha um tempo, mas nunca iniciei a leitura, nunca me pareceu o momento certo, nunca me sinto sensível e aberta o bastante para iniciar a leitura... Mas quem sabe não e agora? Amei a resenha e parabéns por instigar na medida perfeita.

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  4. Assisti o filme e gostei, o livro ainda não li, acho interessante saber sobre outras culturas até me surpreendo com algumas delas. A historia da personagem é triste ter que deixar a família e conviver com outras pessoas, ela aprendeu muito pelo visto com essa vida.

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  5. Nossa, não conhecia esse livro ainda.
    A sinopse me prendeu de uma tal forma que já quero correr pra livraria e comprar esse livro haha
    Sua resenha também não ficou pra trás, que história MARAVILHOSA.
    Daquelas que prendem o leitor do início ao fim. Fora esse diferencial que nunca li.
    Confesso que me interessei e muito. Já coloquei na minha listinha de leituas :)
    Espero conhecer essa obra em breve, muuuuito em breve.
    Beijos,
    Caroline Garcia

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  6. Caramba,eu nunca tinha ouvido falar desse livro,mas me incomodei de como a história parece ser real e triste quando li sua resenha. Imagina que senti isso só lendo a resenha,imagina se ler o livro? Nunca li nada que falasse sobre os costumes do Japão e nada sobre as gueixas,mas agora quero ler esse livro. Obrigada por compartilhar conosco! Um grande abraço ;)

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  7. Oi, Bel!
    Eu gosto muito de livros/filmes que começam com o personagem idoso e ele começa a nos contar o que aconteceu, nos prendendo a ponto de ficar se perguntando o que aconteceu entre o jovem e o idoso para ele ser quem é hoje. Foi esse o caso, né?
    Assim como você, esse é um livro que eu queria ler, mas não li ainda. E nem vi o filme. Acho melhor me guardar para o livro, pelo que você disso tão bom!
    <3
    Gosto da cultura japonesa e sei pouquíssimo sobre as queixas. Bom saber que o autor realmente pesquisou e imergiu nesse universo.

    Beijoooos

    www.casosacasoselivros.com

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  8. Humm eu tenho que dizer que não me interessei muito pelo livro, nada contra a cultura que na verdade é maravilhosa, mas porque neste momento estou procurando outros estilos de livros. Mas fico feliz que tenha gostado do livro, só que dessa vez eu dispenso a leitura.

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  9. Oi Bel,
    Parabéns pela resenha! Esse é um dos livros que quero muito ler, há tempos que tenho curiosidade de conferir essa bela história. Assisti ao filme recentemente e me apaixonei, imagino que o livro seja ainda mais comovente e emocionante. Adoro uma história detalhista, e se o livro é escrito com as próprias memórias da personagem acredito que vou ficar completamente envolvida, ainda mais com essa riqueza dos detalhes dessa cultura milenar, tornando a leitura tão realista. Uma obra escrita com maestria, leitura obrigatória para 2017!
    Beijos

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  10. Oi, Bel!
    Não é a primeira vez que vejo alguém lendo esse livro e se encantando com a história da Chiyo. Pra mim, Memórias de uma Gueixa é um clássico, do tipo pra ler antes de morrer. Já vi partes do filme e me encantei pela Chiyo, e acredito que no livro eu vá sentir isso ainda mais. Acho muito bonito isso de o autor ir dando tanta personalidade ao personagem que chegue ao ponto de nos fazer sentir que é real, é definitivamente um livro que eu pretendo ler.

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  11. Oi Bel *-*
    Então, eu já tinha visto essa capa e tinha me chamado a atenção, mas não parei para ver a sinopse, e nem procurei por resenhas, e ainda bem que estou lendo essa resenha agora.
    Primeiro, parabéns, as resenhas de vocês aqui no blog são maravilhosas, cheias de detalhes, e coisas que fazem o leitor ter interesse e ler o livro o quanto antes.
    Não conheço muito da cultura do Japão, mas percebia que o livro passa um pouco disso também.
    E eu jurava pelo começo da sua resenha que era uma biografia sabe? O autor realmente está de parabéns, e prender o leitor de uma forma que ele não queria pular as linhas, ou ficar com tédio em determinados momentos é algo excelente. Ansiosa pela leitura *-*
    Beijos, e parabéns mais uma vez, arrasou.
    Lost Words

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  12. Eu assisti ao filme e super amei!
    O livro, eu não tive a oprtunidade de ler, mas pelo filme e por conta de sua resenha muito bem escrita, dev ser um livro e tanto!
    Preciso já!


    Beijos,
    Danny
    Irmãos Livreiros

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  13. Fascinada por suas palavras "O autor cria uma ficção tão realista no que tange à personalidade complexa da narradora que é difícil de assimilar que não tenha existido uma Sayuri de verdade."

    Eu assisti parte do filme (pois tava passando na tv e eu tive que desligar)
    mas já sabia que tinha o livro, e queria muito ler pra ter a experiencia de sentir mais ainda a historia, lendo os pensamentos e as descrições!
    Eu gosto muito da cultura oriental em geral, e ter mais esse contato com a cultura japonesa só iria me deixar mais animada!
    Já coloquei na wishlist sim ou claro?! rsrs *-*

    simplyonestory.blogspot.com.br

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